Na noite de domingo para segunda experimentei meu primeiro `mal estar`, pra nao dizer que quase morri de tanto vomitar. Nao dormi nada. Teria sido algo que comi? Nao sei - provavelmente, apesar de todos os cuidados. Durante o dia, entao, `curti` minhas ultimas horas em Calcuta, totalmente zumbi e mal, tomando o soro que a minha Tia Marisa - medica - indicara e que minha mae - a responsavel pelo item `primeiros socorros` da viagem - providenciou.
As 17h eu estava no consulado pra pegar o visto. Falaram pra chegar entre 17h e 17h30, mas so abriram as 18h15. Tipico. Tive que sentar no chao imundo, na calcada, pra esperar, pois nao me aguentava em pe, pela noite mal dormida e o mal estar que persistia. Felizmente, meu visto para 30 dias estava pronto!
Eu, preventivamente, ja havia comprado a passagem de onibus - nao remarcavel - correndo o risco de perder dinheiro, mas deu tudo certo.
Dormi algumas horas e as 2h30 da manha o funcionario do hotel me acordou. Equivocado, pois eu so deveria levantar as 4h30. So depois de tudo pronto eh que percebi que ainda era cedo demais. Enfim, as 5h o taxista com quem eu tinha marcado chegou. Fui para a estacao de onibus, pesei a bagagem - surpreendentemente nao me cobraram nenhuma taxa pela bagagem extra -, entrei no onibus - melhor do que eu imaginava, mas com poltronas nao reclinaveis, sem banheiro e com grande parte da bagacem na parte superior, coberta por uma lona - e `apaguei`. Acordei 2 horas e meia depois, quando chegamos na fronteira. Todos descemos, carimbamos o passaporte pra sair do pais, entramos de novo no onibus. Alguns minutos depois ja estavamos em Bangladesh! Novamente descemos, tivemos nossos passaportes carimbados. No onibus so havia nacionais da India, Bangladesh e eu. Alem do motorista, havia um outro funcionario que foi muito gentil e atencioso comigo. Ele me acompanhou em todos os lugares para carimbar o passaporte, falando em Bangla com os oficiais e explicando sobre mim. A unica hora em que ele me deixou, fiquei perdida e nao sabia voltar para o onibus! Foi deprimente quando um homem fardado chegou e perguntou: "Algum problema?" e eu respondi: "Na verdade nao sei onde esta o meu onibus". Nesta hora eu vi o funcionario do onibus, agradeci o oficial e fui andando rapido e olhand
o pro chao ate ele, sem prestar atencao - mesmo que prestasse nao entenderia nada - no que as pessoas na rua falavam comigo.
Depois disso alguns oficiais, fardados, escolheram algumas malas no onibus para abrir e - claro! - uma das minhas. Entao fui ate la, destranquei o cadeado. Enquanto isso o funcionacio do onibus explicava para outro oficial que eu era uma estudante brasileira indo para un internship program. Este oficial, entao, comecou a gritar pra mim `NO NEED! NO NEED!" Acho que ele queria dizer que eu nao precisava abrir minha bagagem, mas ja era tarde demais: o outro oficial ja estava revistando. Muito `azaradamente`, eles pegaram justo a bagagem com coisas intimas. Por cima havia duas calcas jeans e duas camisetas, mas o oficial enfiou a mao la no meio e puxou alguma coisa. Levantou e, surpresa: era um absorvente!!! Ele olhou alguns segundos e eu so pensei: 'so falta ele me perguntar o que eh isso e eu ter que explicar, em ingles..." Mas acho que ele sabia o que era, pois comentou algo em bangla e todos os outros oficiais riram. Nessa hora eu nao me senti nada bem. Tranquei a mala e voltei para o meu lugar no onibus. O senhor que estava do meu lado viu que eu nao tinha achado nada engracado a situacao la embaixo e comecou a conversar comigo. Perguntou se eu tivera algum problema com os oficiais. Eu disse que nao. Entao ele comecou a perguntar sobre mim: de onde eu era, qual era o meu nome, por que estava indo para Bangladesh, o que meus pais faziam... Ele eh um professor de matematica aposentado e estava em Calcuta porque a filha esta tentando entrar no mestrado la. Contei que meu pai tambem era professor de matematica e que eu tambem era estudante.
Nessa hora eu ja estava morrendo de fome e decidi abrir a caixinha que tinha o cafe da manha proporcionado pela companhia de onibus: um ovo cozinho, uma especie de bolinho -mae benta - dentro de um saquilo lacrado - industrializada -, um salgado frito, uma mexerica e uma maca. So tive coragem de comer a mexerica, o bolinho e o ovo, que eram os `descascaveis`. Mais tarde o senhor do meu lado abriu um pacote de bolacha e me ofereceu. Nao aceitei, mas ele insistiu muito: "Aceite! Voce eh como a minha filha! E seu pai tambem eh professor de matematica!" Achei os argumentos convincentes (hehehe) e aceitei.
As 14 horas paramos para almoco. Entrei numa especie de `posto` na estrada. Mesas lotadas de pessoas comendo com as maos. Tudo parecia tao sujo que eu so comprei um saquinho de chips, um pacote de bolacha e agua mineral. O resto da viagem foi tranquilo: cochilos interrompidos pelas risadas dos outros passageiros que assistiam a um filme - do qual eu nao entendia nada! Entre um cochilo e outro aconteceu algo muito engracado: abri os olhos e vi que do lado havia um rio e que o meu onibus e os outros veiculos nao se moviam. Devia ser um engarrafamento. No entanto, estranhamente um grande bloco de terra se movia lentamente no rio. So quando o bloco de terra terminou eh que eu percebi que estavamos numa especie de balsa, atravessando o rio! Eh, eu devia estar, mesmo, quase delirando de sono!!!
Cheguei em Dhaka as 19h20 da noite, passando pela maior dificuldade ate entao, mas tambem por uma das maiores provas de que tudo vai dar certo: o representante do hotel, que deveria estar me esperando, nao estava la. Antes de pegar minha bagagem dei uma olhada - nada! Entao uma mulher que estava n
o onibus me perguntou como eu iria embora e se eu sabia que este nao era um pais seguro para mulheres, que eu nao deveria andar sozinha. Expliquei que alguem do hotel iria me encontrar la. Ela chamou o marido, pegou o celular dele e disse: `ligue para esta pessoa que vem te buscar`. Fiquei meio assustada, mas percebi que era, realmente, necessario. O filho dela ligou pra mim e conversou com o gerente do hotel. Ele falou para eu esperar la, que iam me buscar. Entao a mulher disse que eu nao podia esperar sozinha. Resultado: ela e o marido - que tinham, tambem, viajado 12h - e os filhos - que tinham ido busca-los - ficaram la comigo esperando. Fiquei conversando com a filha dela, que faz mestrado em Economia Domestica e algo relacionado a Psicologia. O filho - que esta no colegial - ficava fazendo piadas sobre tudo, pra me fazer rir, porque todos perceberam que eu estava um pouco nervosa com a situacao. Como o homem do hotel nao chegava, a mulher disse: "E e se ele nao vier?" "Entao pegarei um taxi" - respondi. Ela disse que, de forma alguma, eu poderia fazer isso sozinha e perguntou se eu passaria a noite com a familia dela, na casa deles. Fiquei novamente assustada e disse que ele ia chegar. O marido ligou novamente e muito tempo depois, finalmente, o tal senhor chegou. Ele disse que confundiu o lugar que eu ia chegar. Agradeci muito a familia que tinha me ajudado e a moca me passou o celular dela, dizendo que eu deveria ligar a qualquer momento, se precisasse de qualquer coisa.
No caminho para o hotel, entao, eu derramei a primeira lagrima em territorio asiatico, seguida por varias outras. No hotel, tomei meu primeiro banho quente em dias, comi uma comida super apimentada - apesar de ter pedido `non spicy, please!` - e dormi.
*Obs: Fotos em Calcuta!!!